Levantamento revelou ainda redução na prevalência de cáries nos últimos sete anos

Mais de 7 milhões de idosos brasileiros precisam de dentadura. Mesmo com o investimento de R$ 600 milhões destinados ao programa de governo para saúde bucal em 2010, o Ministério da Saúde admitiu que não tem condições para atender a essa demanda. Levantamento apresentado ontem aponta avanços quanto à prevenção e ao tratamento de cáries, mas também destaca uma série de problemas — entre eles, o que se refere aos idosos.

De acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde Bucal, 38% da população entre 65 e 74 anos precisa de próteses totais para arcada dentária e os laboratórios públicos têm capacidade de produzir apenas cerca de 500 mil unidades por ano. O ministro José Gomes Temporão, que deixa o cargo nos próximos dias, reconhece o problema. “É um deficit que precisamos resolver, mas pretendemos ampliar a quantidade de laboratórios e esperamos que os municípios façam convênios com instituições privadas para resolver a demanda”, diz.

O ministro da saúde José Gomes Temporão faz um balanço dos avanços na saúde bucal durante o governo Lula

Francisco Oliveira Sobrinho, 71 anos, conta que sentia muita dor de dente quando era jovem. “Não tinha condições de pagar um dentista e nunca tive assistência de saúde pública para tratar da boca, por isso perdi muitos dentes”, lamenta. Morador do Gama, Francisco trabalha como vendedor no shopping Popular e sonha em melhorar a aparência. “Se o governo me desse a chance de arrumar o sorriso, acharia muito bom”, empolga-se.

Para avaliar a saúde dos dentes dos brasileiros, o estudo utilizou o índice CPO — que calcula a soma de dentes cariados, perdidos e obturados. O Norte foi a única região do país onde esse indicador apresentou aumento (leia quadro abaixo). Segundo Gilberto Pucca, coordenador de saúde bucal do ministério, o difícil acesso de agentes de saúde a alguns municípios da região é um dos fatores que atrapalham a evolução do tratamento. “No próximo ano, vamos aumentar o número de equipes de saúde bucal na Região Norte e criar incentivos para levar profissionais de saúde às áreas precárias”, promete.

Com os resultados da pesquisa, o Brasil passou a integrar o grupo de países com baixa prevalência de cáries. Segundo a classificação da Organização Mundial da Saúde (OMS), o indicador CPO deve estar entre 1,2 e 2,6. O índice no país passou de 2,8 em 2003, para 2,1. Brasil e Venezuela apresentam o mesmo índice, inferior à média dos países das Américas (2,8). O levantamento foi feito por meio de entrevistas e exames bucais em 38 mil pessoas de 177 municípios brasileiros, incluindo as 26 capitais e o Distrito Federal, e mostrou que a proporção de crianças livres de cárie aumentou em 26% desde 2003. Hoje, 1,4 milhão de crianças não têm nenhum dente cariado.

Cuidados do berço
A Pesquisa Nacional de Saúde Bucal, divulgada ontem, avaliou também os dentes das crianças de 5 anos de idade, especificamente. Apesar da quantidade de dentes de leite afetados por cárie ter diminuído nos últimos sete anos, cerca de 80% deles não foram tratados. De acordo com a pediatra Maria Cristina Senna Duarte, mestre em saúde da criança pela Fundação Oswaldo Cruz, a presença de cárie, mesmo em dentes de leite, pode ser prejudicial. “O dente cariado pode ser um foco de infecção. E o ideal é trabalhar a prevenção”, diz.

Para a especialista, nutrição adequada e higienização bucal desde o nascimento são fundamentais. “Bebês e crianças com cárie são mal nutridas ou não receberam os cuidados adequados”, lamenta. Aleitamento materno exclusivo até o sexto mês de vida é um dos fatores determinantes para evitar problemas bucais. “Além de evitar a exposição a bicos artificiais, o leite materno contém substâncias que protegem a gengiva do bebê”, explica. Depois dessa idade, deve-se evitar a adição de açúcar nos alimentos da criança. “O leite ou chá não precisam ser adoçados. Os açúcares são os grandes vilões não só quanto ao desenvolvimento de cáries, mas também na prevenção de outras doenças”, diz.

A higienização deve ser feita mesmo sem a presença de dentes. “Principalmente antes de dormir, deve-se limpar a gengiva do bebê com água filtrada e fervida. Depois dos 18 meses de idade pode-se usar escovas específicas. A partir dos dois anos pode-se fazer aplicação anual de flúor, mas pasta de dente fluoretada pode ser usada apenas a partir dos quatro anos”, recomenda.

Angela, 5 anos, já sofre com dores de dente. A mãe, Rosinete Vasconcelos, 37 anos, conta que, por diversas vezes, tentou agendar consultas com dentistas da rede pública, mas não conseguiu. Ela diz também que nunca recebeu orientações de como limpar a boca da filha. “Hoje, ela está com a boca toda cariada e reclama de dor.”

(Carolina Khodr, Correio Braziliense)