Entre a cruz e a espada. Essa é a situação enfrentada por pedestres que trabalham ou moram no Setor de Indústria e Abastecimento (SIA), Guará, Vicente Pires, Águas Claras e Setor Lucio Costa, regiões às margens da Estrada Parque Taguatinga (EPTG). Em obras desde abril de 2009, a pista teve suas vias expressas e marginais liberadas para veículos no domingo último. Entretanto, a construção de passarelas, meios-fios e paradas de ônibus, bem como a sinalização e urbanização das margens e canteiros, ainda não foi concluída. O resultado é um tráfego intenso e confuso de veículos cruzando com as máquinas que finalizam as reformas; visibilidade difícil; falta de iluminação; solo irregular com pedras e lama; pontos de ônibus improvisados e passarelas suspensas sem corrimões. Quem anda a pé pela rodovia tem que fazer uma escolha entre enfrentar o vaivém interminável de carros em alta velocidade ou caminhar a mais de dois metros do chão, sem nenhuma estrutura de apoio.

Na noite de segunda-feira, as condições precárias fizeram uma vítima. Um jovem com idade aproximada de 20 anos, sem documentos pessoais, foi atingido em cheio por uma Belina quando ia atravessar a via de Águas Claras para Vicente Pires, na altura do Km 7, bem ao lado de uma das oito passarelas sem corrimão existentes — ao todo são 16 na EPTG, sete com grades de proteção já instaladas e uma subterrânea, na altura do Guará. De acordo com uma testemunha, o veículo arrastou a vítima por cerca de 100 metros, até o viaduto Israel Pinheiro. O motorista fugiu sem prestar socorro.
“Um minuto que você vacila, você vai para o saco”, sentencia Arnóbio Teodoro da Silva, morador de Vicente Pires, que viu o acidente e conversou com o Correio ontem. “É muito difícil atravessar, tem que estar ligado, olhando para todos os lados. Uma vez, duas senhoras ficaram mais de uma hora esperando uma brecha, porque os carros passam muito rápido. A sorte foi que um policial apareceu e, a muito custo, parou o tráfego”, conta.

Arnóbio diz não ter coragem de enfrentar as passarelas. “Na verdade, não pode fazer isso. Tem placas proibindo”, frisa. Na passarela situada no trecho onde o jovem foi atropelado e morreu, o aviso estava enlameado e havia sido derrubado pelas chuvas.

Arnóbio da Silva trabalhou alguns meses para o consórcio que faz as reformas na EPTG, contratado via licitação pelo Departamento de Estradas de Rodagem no DF (DER-DF), órgão responsável pelas obras. Para ele, a pista está longe de estar pronta.

A 38ª Delegacia de Polícia (Vicente Pires) investiga o atropelamento fatal. O corpo do jovem atropelado na EPTG está no Instituto de Medicina Legal (IML). No balcão da unidade, um atendente informou que até as 17h de ontem nenhum familiar havia aparecido para identificá-lo.

Desrespeito
Mesmo com as placas de aviso do DER-DF — com os dizeres “Proibido passagem, passarelas em obras” — , muitos pedestres consideram mais seguro enfrentar os caminhos suspensos sem estrutura de contenção do que os veículos na pista. Enquanto a reportagem percorria a EPTG ontem, flagrou duas pessoas se aventurando nas alturas. Também se deparou com uma parada de ônibus lotada feita de lona, no canteiro central entre o Guará e o Setor Lucio Costa.

Para o autônomo Corino José da Rocha, 52 anos, o período de chuvas deixa a EPTG ainda mais perigosa para os pedestres. Morador de Taguatinga, ele atravessou o asfalto ontem com a mulher e o filho após muito tempo de espera, debaixo de chuva. “Os carros não param. Se hoje (ontem) fosse dia de semana em vez de feriado, seria ainda mais movimentado”, comentou.

João Vítor Nogueira dos Santos, 15 anos, se queixa de que as faixas de pedestre são escassas, distantes das paradas de ônibus e são desrespeitadas pelos motoristas. A equipe do Correio constatou a existência de somente quatro faixas do SIA até Taguatinga.

Procurado, o DER-DF disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que recomenda a quem tem de andar a pé pela EPTG atravessar somente nos pontos onde há faixa de pedestre ou semáforos. A sinalização, construção de meios-fios, urbanização, finalização dos novos pontos de ônibus e conclusão das passarelas devem ocorrer somente em duas semanas.

MEMÓRIA
31 de janeiro de 2010
Uma moto atingiu Daiana de Souza Marques, 21 anos, e, em seguida, caiu no córrego Vicente Pires. Everton Sampaio Santana, 41, que dirigia a moto, e a passageira Maria Araújo, 37, morreram na hora. Daiana sofreu escoriações pelo corpo.

15 de julho
Darel Salleck, 19, morreu após cair de uma moto e ser atropelado por um ônibus também na EPTG.

7 de setembro
Um rapaz de 21 anos morreu atropelado perto de Águas Claras. O motorista fugiu sem prestar socorro.

DIMENSÃO
R$ 306 milhões – Total de recursos destinados às obras da EPTG

160 mil – Número de carros que transitam diariamente pela pista

12,7 km – Extensão linear da malha viária reformada

77,2 km – Quantidade de asfalto novo feito na pista

16 – Número de passarelas de pedestres, sendo uma subterrânea

(Fonte: Mariana Branco, Correio Braziliense)